A pressão popular foi implacável, e os vereadores de Tangará da Serra (240 km de Cuiabá) não tiveram alternativa senão recuar. Apenas um dia após aprovarem, sob intensos protestos, a criação de auxílios de R$ 5 mil para eles mesmos, os parlamentares anunciaram a revogação do benefício. A decisão veio após uma enxurrada de críticas da população, que se manifestou com cartazes, vaias e gritos de “vergonha” durante a sessão em que o aumento foi aprovado.
A proposta previa o pagamento de R$ 2,5 mil de auxílio-alimentação e R$ 2,5 mil de auxílio-saúde para cada vereador, elevando significativamente os ganhos dos parlamentares. A medida revoltou os moradores, que apontaram o contraste entre os benefícios concedidos aos políticos e a realidade de trabalhadores que sobrevivem com um salário mínimo de R$ 1.518,00.
Diante da pressão crescente, a Câmara Municipal divulgou uma nota justificando a decisão de revogar os auxílios. No comunicado, os vereadores tentam minimizar o impacto da proposta, afirmando que os recursos seriam provenientes do duodécimo da Casa e que a revogação ocorreu por uma suposta “falta de compreensão” da população. No entanto, a reação popular mostrou que a sociedade entendeu muito bem do que se tratava e não aceitou a manobra.
A sessão da última terça-feira (11.03) foi marcada por momentos de tensão. Com o plenário lotado, os cidadãos protestaram, cobrando coerência dos vereadores. Durante a leitura da nota de esclarecimento pelo presidente da Câmara, Edmilson Porfírio, os gritos de indignação abafaram a tentativa de justificativa. A revolta foi tamanha que a sessão precisou ser suspensa por 15 minutos. Quando retomada, os parlamentares aprovaram o aumento sem debates e saíram apressadamente do plenário, enquanto os cidadãos já articulavam um abaixo-assinado contra a medida.
O comerciante Gilson Rodrigues Gonçalves, morador de Tangará da Serra desde 1969, foi enfático ao criticar a decisão dos vereadores. “Se fosse para abaixar o salário ou aumentar a carga horária de trabalho deles, jamais aprovariam. Eles já ganham quase R$ 17 mil, agora queriam aumentar para mais de R$ 22 mil. Nós usamos a UPA, por que eles não podem usar também? Não sou obrigado a pagar o plano de saúde deles nem a alimentação”, protestou.
Apesar da revogação, a tentativa de aprovar o aumento sem debate deixou uma marca de desconfiança sobre os vereadores de Tangará da Serra.
Confira o comunicado:
“A maioria dos vereadores da Câmara vem, por meio desta nota, esclarecer à sociedade de Tangará da Serra que, ao longo da história, a instituição tem zelado pelos recursos do seu orçamento e pela economia de seus vereadores. Como resultado desse zelo, todos os anos a Câmara devolve à Prefeitura as sobras desses recursos.
Ressaltamos que as medidas administrativas ora propostas pela Câmara Municipal não foram adotadas em anos anteriores porque acreditávamos que não haveria recursos significativos para serem devolvidos à Prefeitura. No entanto, com o passar dos anos, a saúde financeira da Câmara Municipal se fortaleceu, permitindo a realização dessa estruturação administrativa e, ainda assim, garantindo um montante considerável para ser devolvido à Prefeitura, como ocorre anualmente.
A Câmara já devolveu, ao longo dos anos, mais de 4 milhões de reais à administração pública municipal. Além disso, queremos esclarecer que o projeto referente aos auxílios dos vereadores é custeado exclusivamente pelo orçamento do Poder Legislativo, sem impactar em nada o orçamento da Prefeitura e sem afetar áreas essenciais como saúde, educação, obras e outros serviços públicos. Caso houvesse qualquer impacto negativo, seríamos todos contrários a esse projeto, que sequer existiria nessas circunstâncias.
Buscamos esclarecer a origem dos recursos, porém, algumas narrativas criadas distorceram as informações e inflamaram parte da sociedade de forma equivocada, gerando incompreensões sobre o tema. Reafirmamos que esta sempre foi e continuará sendo a casa do povo.
Agradecemos as inúmeras mensagens de apoio de empresários e entidades que leram e entenderam a lei. No entanto, diante da falta de compreensão por parte de uma parcela da população, esta Casa de Leis reconsidera o projeto e irá propor sua revogação, atendendo à vontade popular. Isso demonstra que nossos vereadores nunca estiveram atrás de subsídios e que abrem mão desse direito em prol da paz e da normalidade entre as instituições, a sociedade e nossas famílias. Entendemos as críticas e as discordâncias, mas repudiamos qualquer forma de agressão motivada por opiniões divergentes. Infelizmente, alguns indivíduos inflamaram a população, incentivando possíveis agressões, o que deixou vereadores e seus familiares apreensivos. Tal atitude é condenável e inaceitável.
A Câmara Municipal, em respeito à sociedade que não compreendeu o projeto de lei, não se sente enfraquecida ao reconsiderá-lo. Pelo contrário, reforçamos nosso compromisso com a vontade popular. Assim como em anos anteriores, a Câmara continuará devolvendo milhões de reais à Prefeitura, fruto do zelo com o gasto público e da revogação desta lei.
Esse recurso será destinado ao prefeito municipal para investimentos na saúde, educação, obras e valorização dos servidores públicos. Além disso, defendemos que parte desse montante seja investida em instituições como a APAE, ADIN e outras entidades que prestam serviços essenciais à sociedade. A partir de agora, cabe à imprensa e à sociedade, de maneira geral, cobrar a execução dessas ações do Poder Executivo por meio do prefeito municipal.
Encerramos reafirmando nosso compromisso com a transparência na administração dos recursos públicos e com a independência na fiscalização, cobrança e proposição de obras e serviços para o município".