Após mais de duas décadas de tramitação judicial, a Justiça Federal determinou que a empresa Juruena Energia, responsável pela Pequena Central Hidrelétrica (PCH) Juína, indenize a comunidade indígena Cinta Larga por danos ambientais e perdas territoriais causadas pela instalação do empreendimento. A sentença foi proferida após ação movida pelo Ministério Público Federal (MPF), que apontou impactos irreversíveis ao meio ambiente e à vida dos indígenas nos municípios de Aripuanã e Juína, em Mato Grosso.
A decisão obriga a empresa a realizar o licenciamento ambiental da usina junto ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), além de obter autorização do Congresso Nacional para o uso de terras indígenas. O projeto avançou sobre território demarcado, sem a devida autorização legal. A empresa terá um prazo de 12 meses para cumprir as exigências, sob pena de suspensão das operações da hidrelétrica.
A Juruena Energia foi condenada a indenizar os indígenas Cinta Larga pelos danos materiais causados pela perda de parte de seu território e recursos naturais, além de pagar royalties mensais pela energia gerada pela usina. A sentença também determina o pagamento de R$ 200 mil por danos morais coletivos, valor que será destinado à comunidade por meio da sua associação.
O procurador da República Ricardo Pael, responsável pela ação, destacou a importância da decisão para garantir a proteção dos direitos indígenas. "Após 20 anos de tramitação e muitas tentativas de acordo, a ação foi sentenciada por se concluir que alguns direitos indígenas são irrenunciáveis, não são passíveis de transação, como a perda territorial ocorrida neste caso. Não sei se a compensação chegará a tempo para os indígenas Cinta Larga, mas o exemplo da decisão servirá para questões futuras", afirmou Pael.
A construção da PCH Juína teve início em 1983 e foi concluída em 1993, sem a devida autorização para o uso de recursos em terras indígenas e sem o licenciamento ambiental adequado. Em 2005, o MPF ingressou com a ação, questionando a validade das licenças emitidas pelo Estado de Mato Grosso e defendendo que o licenciamento deveria ser realizado pelo Ibama, uma vez que a hidrelétrica ocupa um rio interestadual, que atravessa o Amazonas e o Mato Grosso, e interfere em terras indígenas protegidas pela Constituição. Além disso, o uso de recursos naturais em território indígena exige autorização do Congresso Nacional, o que nunca foi solicitado.
Um estudo técnico realizado pelo MPF apontou danos ambientais irreversíveis e impactos severos na vida do povo Cinta Larga, como a perda de fauna e flora, a alteração de áreas de caça e pesca e a degradação da qualidade de vida da comunidade. Aproximadamente 193 hectares do território indígena foram alagados para a instalação dos reservatórios da usina, o que comprometeu o modo de vida tradicional do povo Cinta Larga.