Por Andreia Barros Müller Coutinho*
Recentemente, uma decisão judicial chamou atenção ao autorizar a penhora de 30% do seguro-desemprego de um devedor para quitar uma dívida com um fundo de investimentos. A decisão foi proferida pela juíza Helen Komatsu, da Vara Única de Cardoso de São Paulo, justificando que a penhora não comprometeria a subsistência do devedor.
O Código de Processo Civil estabelece no art. 833, que “são impenhoráveis os valores recebidos a título de salário, aposentadoria” e outros benefícios que garantem a subsistência do devedor. O parágrafo 2º do mesmo artigo abre uma exceção apenas para a penhora em casos de prestação alimentícia. Além disso, a Constituição Federal, em seu artigo 7º, inciso X, protege o salário e benefícios trabalhistas de penhora arbitrária.
O seguro-desemprego, especificamente, é um benefício assistencial pago pelo Governo Federal para garantir a sobrevivência do trabalhador desempregado até que ele encontre uma nova colocação no mercado. Assim, permitir sua penhora fere a própria finalidade do benefício e pode gerar uma situação de extrema vulnerabilidade para o cidadão.
Como advogada discordo totalmente com a decisão judicial supracitada, pois o próprio nome já diz: seguro-desemprego, ou seja, é um auxílio financeiro destinado a uma pessoa que está enfrentando um momento de crise. Não faz sentido permitir que parte desse valor seja penhorado para pagar dívidas de qualquer natureza.
É importante ressaltar que, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem flexibilizado a regra da impenhorabilidade em alguns casos, mas o seguro-desemprego deve ser tratado com ainda mais rigidez, pois o salário já tem sido relativizado para algumas penhoras, e, agora querem atingir até mesmo um benefício assistencial. O próximo passo será permitir que o Bolsa Família também seja penhorado.
A decisão permitindo a penhora do seguro-desemprego abre um perigoso precedente, pois o Judiciário coloca o cidadão desempregado em uma situação ainda mais crítica, podendo levá-lo a um endividamento maior para arcar com despesas básicas.
Além disso, tal decisão vai na contramão da proteção social assegurada pela Constituição. O seguro-desemprego é uma ferramenta de amparo ao cidadão, e não uma fonte de recursos para a satisfação de credores. A decisão de autorizar a penhora do seguro-desemprego deve ser amplamente debatida, pois seus impactos podem ser devastadores na vida do beneficiário.
O Judiciário precisa ter cautela ao adotar tal medida, já que a flexibilização da impenhorabilidade desse benefício pode ser o primeiro passo para um enfraquecimento das garantias fundamentais prevista na Constituição Federal.
*Andreia Barros Müller Coutinho é advogada inscrita na OAB/MT 15.372, sócia-diretora do escritório MÜLLER COUTINHO ADVOCACIA.
Lourdes Maria Coutinho 19/02/2025
Uma explanação maravilhosa. Parabéns!!!
1 comentários