Por Danielle Barbato*
O ano era 1990. Fernando Collor tomou posse como presidente em 15 de março de 1990 e, imediatamente, baixou 21 Medidas Provisórias e dezenas de portarias – entre elas a Medida Provisória 168, convertida na Lei 8.024, bloqueando o dinheiro dos fundos de renda fixa, das contas correntes, dos investimentos e das cadernetas de poupança. A população poderia sacar um total de até 50 mil cruzados novos – o que, em 2024, corresponde a R$ 13.113.
Na ocasião, cerca de 80% do dinheiro em circulação no País ficou bloqueado – um valor que correspondia a aproximadamente 100 bilhões de dólares ou 30% do PIB brasileiro.
O efeito colateral do confisco de Collor foi instantâneo e desestruturou completamente a economia. Pessoas que tinham dívidas e contavam com este dinheiro para pagar suas despesas, para pagar uma prestação imobiliária, de repente viram que não podiam mais contar com esses recursos. Foi uma completa desestruturação dos canais produtivos da economia, jogando o Brasil numa imensa recessão.
Após pressão popular, foi instaurado o processo de impeachment de Collor, com 441 votos a favor (eram necessários 336), 38 contra, 23 ausências e uma abstenção. Collor renunciou ao cargo de presidente do Brasil enquanto enfrentava um processo de impeachment no Congresso.
O tempo passou e o ano agora é 2024. Na calada da noite, Executivo e Congresso conceberam uma nova aberração fiscal: o confisco de “dinheiro esquecido”. A Câmara aprovou um projeto que permite que o governo considere que todo o “dinheiro esquecido” pelos brasileiros em contas bancárias é dele. Se você acha que isso não deve dar nada, saiba que o valor total do que os clientes deixaram parado em contas passa dos R$ 8,5 bilhões.
Na prática, o Tesouro Nacional vai considerar o dinheiro como receita primária, como se tivesse sido arrecadado via impostos. Obviamente virou polêmica, afinal, trata-se de uma transferência do setor privado para o público sem autorização. Ou em outras palavras, confisco.
Confisco é o ato pelo qual o Estado, aqui denominado fisco, valendo-se do seu poder assume a propriedade de bens de alguém sem pagar a indenização correspondente. Confiscar é apropriar-se o Estado de bens do particular. E o efeito confiscatório, em linhas gerais, traz a ideia de punição, ou seja, impregna na mente de quem está interpretando que quem não paga o tributo terá algum bem expropriado para quitar a dívida.
A oposição liderou a obstrução na Câmara contra o confisco de milhões de reais dos brasileiros incluído no Projeto de Lei 1847/24, que trata da reoneração da folha de pagamento. O Congresso já aprovou a desoneração da folha até 2027, mas o governo recorreu ao Supremo para modificar a lei.
Com efeito, o Brasil precisa atrair investimentos e gerar empregos e renda. Para isso, é preciso uma economia estabilizada. Precisa também de garantia e segurança jurídica, no sentido de que os contratos sejam respeitados. Para que isso aconteça, o governo não pode tomar medidas de força como essa. O confisco de Collor foi uma terrível e excepcional quebra de contrato.
Ao que parece, o Confisco do Collor nas poupanças na década de 1990 serviu de escola para o governo Lula 3. O Brasil acompanhou de perto essa história. Mas, a julgar pela repetição dos fatos, parece que nada extraiu de aprendizado.
Vale trazer à baila um trecho da obra 18 de Brumário de Luís Bonaparte, em especial, a célebre análise de Karl Marx sobre o processo que levou da Revolução de 1848 para o golpe de Estado de 1851 na França (referindo-se a análise do filósofo alemão Hegel sobre a história do “golpe de Estado” na França): “Hegel observa em uma de suas obras que todos os fatos e personagens de grande importância na história do mundo ocorrem, por assim dizer, duas vezes. E esqueceu-se de acrescentar: a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa”.
Entre tragédia e farsa, o governo Lula mostra que não tem qualquer vergonha ou escrúpulo em se apropriar do dinheiro do brasileiro. E mostra – mais uma vez - que nunca foi digno de confiança.
*Danielle Barbato é advogada especializada em Direito Civil e Processo Civil, Direito do Trabalho e Processo do Trabalho, Direito Imobiliário e Gestora Condominial.