As dez maiores empresas em recuperação judicial no agro somaram, juntas, aproximadamente R$ 12,3 bilhões. Entre janeiro e setembro deste ano, o número de pedidos protocolados saltou para 426, contra 80 no mesmo período de 2023.
O agronegócio brasileiro enfrentou um dos seus anos mais desafiadores em 2024, com um crescimento alarmante de 432% no número de pedidos de recuperação judicial (RJ) no agro em comparação a 2023. No acumulado de janeiro a setembro, foram contabilizadas 426 solicitações, contra apenas 80 no mesmo período de 2023.
Segundo dados do Serasa Experian, o segundo trimestre concentrou o maior volume de solicitações, com 214 registros — uma alta de 529% em relação ao mesmo período do ano anterior. De acordo com o Monitor RGF de Recuperação Judicial, a maior parte das recuperações judiciais no setor agropecuário está concentrada em cinco atividades principais: o cultivo de soja, a criação de bovinos para corte, o cultivo de cana-de-açúcar, os serviços de preparação de terreno, cultivo e colheita, e o cultivo de milho. Esses segmentos representam uma parcela significativa das empresas que buscaram reestruturação financeira, evidenciando os desafios específicos enfrentados por essas cadeias produtivas.
Os fatores por trás da crise e aumento dos pedidos de recuperação judicial no agro
Ao Estadão Conteúdo, Arthur Alves Silveira, mestre em direito empresarial e sócio do escritório MSC Advogados, apontou que a crise no setor foi provocada por uma combinação de fatores, como a variação cambial, condições climáticas adversas, preços de commodities em queda e altos encargos financeiros.
Com esses desafios, 2025 promete ser igualmente complexo, especialmente se as condições macroeconômicas se repetirem. “O desempenho da safra pode atenuar um pouco esse cenário, mas ainda é um ponto delicado, pois depende do clima”, acrescentou o especialista.
Grandes empresas entre as mais afetadas
Entre as empresas do agronegócio que solicitaram recuperação judicial em 2024, as dez maiores somaram dívidas de R$ 12,3 bilhões, destacando a gravidade do momento para o setor.
As principais empresas e suas dívidas incluem:
AgroGalaxy Participações – R$ 4,678 bilhões – Goiânia (GO)
Grupo Patense – R$ 2,154 bilhões – Patos de Minas (MG)
Sperafico Agroindustrial – R$ 1,076 bilhões – Toledo (PR)
Usina Maringá e Indústria Comércio – R$ 1,028 bilhões – Santa Rita do Passa Quatro (SP)
Elisa Agro Sustentável – R$ 679,6 milhões – Aruanã (GO)
Outras empresas, como o Grupo Libra Bioenergia (R$ 534,7 milhões) e o Grupo Cella (R$ 327,6 milhões), também buscaram reestruturação financeira, segundo levantamento do escritório Diamantino Advogados Associados.
Pequenos e médios produtores também sofrem
Além das grandes empresas, os pequenos e médios produtores rurais também enfrentaram dificuldades, com o número de pedidos de recuperação judicial por Pessoas Jurídicas no setor aumentando 40,6% no segundo trimestre.
Entre os casos de destaque está o Grupo Manso, de Mato Grosso, que, em dezembro, pediu RJ para renegociar dívidas de R$ 241,74 milhões. A empresa atribuiu suas dificuldades a intempéries climáticas, queda no preço das commodities e juros elevados.
Impactos e perspectivas para o futuro
Marcelo Pimenta, head de agronegócio da Serasa Experian, destacou que o setor enfrenta uma combinação de eventos adversos que pressionam a saúde financeira dos produtores.
Embora o número de recuperações judiciais seja expressivo, ele ainda representa uma pequena parcela do total de propriedades rurais do Brasil, que ultrapassa 5 milhões de unidades. No entanto, a presença de grandes empresas entre os solicitantes acende um alerta para os riscos de efeitos cascata em cadeias produtivas inteiras.
Em nota, Rodrigo Gallegos, sócio da RGF, afirmou que o aumento nos pedidos de recuperação judicial reflete a estratégia de algumas empresas de focarem em renegociações de curto prazo, postergando dívidas sem abordar questões estruturais. “É fundamental que as empresas combinem a renegociação de dívidas com um aumento da capacidade de geração de resultados, o que depende de uma revisão de estratégia e operação”, disse Gallegos.
O agravamento da crise financeira no setor reforça a necessidade de políticas públicas que amenizem os efeitos das mudanças climáticas e dos juros altos, além de soluções específicas para o endividamento rural.
Com o cenário atual, 2025 será um ano de atenção redobrada no campo, e a resiliência será fundamental para superar os desafios impostos ao agronegócio brasileiro.